THE BOOK — EPISÓDIO 6 — OS FEEDBACKS
Segunda-feira, 23h17. Estou sentado em frente ao computador, finalizando mais um texto para ser entregue ainda hoje.
Nas últimas dez semanas essa foi minha rotina, escrever e enviar a cada segunda-feira um novo texto.
Nas quintas-feiras, durante o reality show, é o momento mais esperado: o feedback. Feedback é uma palavra em inglês que significa uma avaliação, um retorno que vai ajudar a melhorar algo — no caso, os meus textos.
No The Book tenho a oportunidade de receber avaliações de duas pessoas experientes, Cinthia e Anderson. Ambos são escritores e também têm uma visão de negócios. É desse tipo de pessoas que quero estar perto.
Por isso, eu sempre espero o feedback das quintas para começar a escrever um novo texto, para saber se estou no caminho certo. Separei aqui sete feedbacks que recebi e que me ajudaram muito a melhorar minha escrita.
Ao longo dessas dez semanas eles compartilharam comigo comentários que me ajudaram a sair de um texto polêmico e espalhafatoso para um material maduro e ritmado. Foi como se pessoas diferentes tivessem escrito meus textos.
O livro que estou escrevendo no The Book é um relato pessoal sobre minha criação como homem. Quando comecei o reality, meu objetivo era colocar tudo para fora, falar sobre o lado da masculinidade que quase ninguém fala em primeira pessoa: os assédios, os vícios, a falsidade, a covardia.
Mas quem quer ler um texto que parece um vômito, uma descarga de informações não elaboradas? Talvez seu terapeuta, quem sabe.
A escrita de um texto pode começar colocando no papel um fluxo livre de informações e pensamentos, sim, mas, para virar um livro com grande alcance, precisa passar por um refinamento.
FEEDBACK 1 — Tenha sempre pelo menos uma pessoa crítica para revisar seu texto antes de enviar para um público maior.
Depois que recebi feedbacks duros (e gentis) sobre um texto problemático que fiz, que falava sem um refinamento de assuntos delicados, como assédio, criei um processo: primeiro eu escrevo alguns parágrafos, em seguida peço para a Fran ler. Peço a opinião dela e escrevo mais.
Quando acabo minha meta de texto da semana (escrevo dois capítulos, cerca de 5 páginas ou 10 mil caracteres com espaços), mando meu texto para a Renata, uma amiga que faz uma segunda revisão.
Só então, depois de duas revisões, mando para a avaliação dos jurados do reality. Com esse processo consegui refinar meu texto e ter tanto notas melhores quanto feedbacks mais focados em como melhorar o que já estava bom, ao invés de só consertar o que estava ruim.
FEEDBACK 2 — Entenda bem para quem é o seu livro.
No começo da escrita adotei um tom de escrita jovem, com gírias e assuntos polêmicos. Só que eu quero mesmo atingir um público mais amplo e mais velho. As pessoas que quero que leiam meu livro tem principalmente entre 20 e 40 anos, e são homens que estão buscando ser pessoas melhores. São homens que já passaram por crises e que decidiram ser uma versão mais inteira de si mesmos.
Ter essa clareza me fez ajustar a linguagem e os temas abordados no meu texto, saindo das polêmicas e trazendo uma abordagem mais reflexiva e engraçada sobre as histórias que conto.
FEEDBACK 3 — Não datar o texto.
Segue um trecho de um texto que escrevi: “Quando eu não tinha alguma festa de 15 anos já programada, eu abria o MSN (o aplicativo para envio de mensagens da época) às 18h de sexta e começava a chamar meus amigos.”
Nossa, hoje sei que isso não se faz.
Aprendi que falar do MSN especificamente não tem relevância nenhuma para criar na mente de quem lê a imagem que eu quero, e ainda faz com que os leitores que não conhecem o MSN se percam na história, fiquem pensando que eu sou velho ou qualquer outra coisa não relacionada com a história que estou contando. Estava contando, na verdade, porque ao datar o texto o leitor perde o foco e para de ler.
FEEDBACK 4 — Partir da premissa que as pessoas não sabem as coisas.
Quando se escreve um livro para um público amplo, é preciso tomar cuidado com siglas ou termos que não são comuns. No meu caso, no texto de introdução do livro incluí a frase “Quando é que tu vai finalmente perder o BV?”.
Só que nem todo mundo sabe que “BV” é “Boca Virgem”. Por isso, mudei depois para “Quando é que tu vai finalmente beijar alguém?”.
Quero que meu texto seja inclusivo, que todos entendam. Não entender o que a pessoa que escreveu quis dizer é chato, já passei por isso muitas vezes. Mas vou poupar meus leitores de ficarem perdidos com siglas ou termos que nunca viram antes.
Na dúvida, explique o que significa, ou encontre um meio mais fácil de dizer a mesma coisa.
FEEDBACK 5 — Texto precisa de continuidade.
O texto precisa ter início, meio e fim. Não dá para incluir um personagem “do nada”, como disse a Raquel. Oi? Quem é Raquel?
Pode relaxar, ela foi só nosso exemplo de um erro de continuidade.
Para ter continuidade, os personagens e as situações precisam estar encaixados, e precisamos nos referir a eles com os mesmos termos. Em um de meus textos, me referi a um personagem primeiro como “um padrinho do casamento”, e mais à frente no texto me referi a ele simplesmente como “meu amigo”. Mas eu não disse antes que o padrinho era meu amigo. Como os leitores poderiam saber que estava me referindo ao mesmo personagem?
Ter continuidade no texto significa ter qualidade, ser constante em lembrar seus leitores do contexto da história, fazendo-os imaginar a mesma cena que você. Erros de continuidade confundem a leitura, fazendo o significado da história se perder. Para resolver esse problema, o próximo feedback deve ajudar.
FEEDBACK 6 — Sempre leia seu texto em voz alta.
Um livro conta uma história. As pessoas gostam de histórias. No Brasil, os textos costumam ser muito diferentes da forma como se fala — isso eu ainda não sei porquê. Por isso, ler seu texto em voz alta faz com que as partes dele que estão distantes de como falamos fiquem evidentes, e isso ajuda a reescrever o texto, para tornar ele mais fluído e natural. Estou fazendo isso agora, por sinal.
Textos que parecem falados costumam ter mais ritmo, parecem mais com uma conversa. Fazem com que as páginas do livro sejam viradas mais rápidas, criando a sensação de uma leitura mais prazerosa.
Esse é meu objetivo, fazer com que ler seja gostoso.
FEEDBACK 7 — O texto não precisa ser linear ou cronológico.
Existe uma tendências em escrever seguindo um passo a passo: eu fiz isso, depois aquilo, e depois tal coisa. Mas isso pode ser chato. Muito chato.
Mas não dá também para falar de uma coisa e do nada abordar outro tema totalmente diferente. Vai parecer sem pé nem cabeça. Para resolver esse problema existem os flashbacks, que são cenas do passado que de repente aparecem no livro. E existem formas para usar flashbacks, já que eles precisam estar, de alguma forma, conectados com a cena presente que está sendo narrada.
Por exemplo: estou narrando um episódio em que senti muita dor, e, usando essa dor intensa como conexão, consigo falar de um outro episódio, do passado, em que vivi outra dor intensa. Ou então estou em um jantar e vejo alguém sentar em uma posição incomum, e usando esse gancho me lembro de outra cena em que vi alguém sentar nessa mesma posição, e conto essa história. O flashback tem o poder de brincar com o tempo, e traz dinâmica e surpresas para o texto, mas precisa estar sempre bem conectado, para não ficar “forçado” e perder o sentido.
FEEDBACK BÔNUS — Continuar, continuar, continuar.
Isso foi o que mais ouvi. É o que mais me irrita e mais me motiva a seguir em frente.
Um livro só fica pronto quando toda história é contada. Mesmo escrevendo há dez semanas, tenho prontos apenas 15 dos 48 capítulos que pretendo escrever. Mesmo que meu texto tenha ganho maturidade ao longo do tempo, preciso continuar. Minha evolução é tangível, visível, mas o texto só fica pronto quando todas as palavras estão escritas.
E continuar é desafiador. Aparecem os compromissos, outras demandas, outras prioridades, emergências. E a história não te chama, não te liga. Talvez venha visitar em sonho, mas você precisa prestar atenção.
Continuar é o que dá sentido a tudo, é o que faz a evolução se tornar uma constante. Por isso que eu escrevo e depois reviso tudo que escrevi, especialmente as primeiras páginas do livro (a parte mais importante, que é quando as pessoas decidem se vão continuar a ler o livro ou não). Todo início de livro merece ser reescrito pelo menos duas vezes.
Mas, aqui, já estamos no final. No final desse texto, no final do reality. Nessa quinta-feira vai ao ar, ao vivo, a final. Minhas notas até que foram boas, mas o aprendizado tem um custo. Esses feedbacks não foram de graça, tiveram muito tempo e trabalho envolvidos. Meu texto era uma sementinha, e com os feedbacks ele está virando uma árvore. Em breve vai dar frutos.
Na final, eu aposto minhas fichas na Fran, que fez um trabalho primoroso desde o início do reality, e, se você acompanhou os textos anteriores, sabe que ela está liderando. As notas das últimas duas avaliações não foram divulgadas, mas quando é para ser, simplesmente é.
Eu acredito nisso. Eu acredito nela. E seja o que os jurados quiserem.
No próximo — e último — capítulo vou contar como foi a final do The Book — um reality show para escritores.
Um abraço poético,